Há um vício em andamento. As letras vivem seu pequeno deleite sempre que por elas passam os olhos dos leitores. A vida há nas letras ou nos olhos de quem lê? sentencia o conhecedor: há de ser nas mãos de quem escreve. Evite esforço, aqui não há espaço para respostas. É a contrução que nos interessa, o caminhar, o processo, a empresa de fazer um pensamento. Espaço da criação do futuro da literatura brasileira. Ler e escrever: o remédio para o vício da criação.

12 setembro, 2009

O Senhor Nogueira








O Senhor Nogueira habita o número 62 da Rue Tournefort há poucos dias. Vem de longa e trabalhosa mudança, quando passou dois meses a embalar a plástico sua coleção de livros proibidos.





Neste exato instante deseja somente sorver com os lábios seu café com leite espumado, e admirar as mocinhas que brincam na Rue Tournefort.





Debruçado a janela, vê passar pela primeira vez o Senhor Mutoi, propietário da quitanda mais importante do bairro.





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O Senhor Mutoi vive há mais de décadas no número 47 da Rue Du Pot De Fer, com sua esposa costureira e o par de filhos inúteis.



É o dono da quitanda e seu produto mais vendido é mesmo abobrinha.



É avesso à crianças e animais de estimação, sendo o seu tempo livre dedicado aos trabalhos manuais com lajota.


Ao cruzar a esquina e adentrar pela Rue Tournefort, observa janelas que se abrem no antigo e há muito vago apartamento do prédio 62.


Sente o corpo excitado com o potencial novo cliente de sua quitanda.


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Na primeira casa da Rue Amyot acaba de acontecer um crime brutal.

Os gritos são assustadores.

E continua nos próximos dias.

Conversas com Dalton Trevisan

A Priminha

Aos treze anos a priminha era a sua maior rival. Tinham a mesma idade e moravam no mesmo bairro. Disputavam a atenção do rapazinho mais velho que vinha de outra cidade.

Um dia convidou os amiguinhos para o banho de piscina. A molecada se esbaldou a tarde toda.

Quando escurecia foram se secar nos brinquedos do quintal.
Decidida a convidar o rapazinho a se sentar no banquinho do balanço com ela, fica em choque ao notar a cena: a priminha a dividir o rema-rema com o rapazinho, num esfrega-esfrega de gente grande.

Voltou à piscina, decidida a se afogar entre as bóias de brinquedo.


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Festinha de aniversário


No dia de seus doze anos a mocinha decide dar o primeiro beijo no namoradinho da escola.

Correm para o matagal atrás da garagem.
Beijinho de estalinho, como manda a cartilha.

O namorado dá o beijinho e saí correndo em disparada deixando a mocinha a chorar e a pensar que seu beijo é ruim. Inconsolável entre arbustos, festa fracassada.

O pobre rapaz, envergonhado, enraivecido, a esbravejar rua afora contra as calças de moletom.

08 setembro, 2009

Para você, que acha que qualquer ventinho é espírito

Eu gostaria de dizer a você algumas palavras fortes, dessas que deixam a boca amargando enquanto são ditas. Eu passei meus últimos dias de estômago embrulhado, a consultar vernáculos, a conjugar verbos e premeditar vírgulas num estado permanente de náusea. A própria pele, que me está amarelo pálida de vitaminas ausentes, a minha pele eu permiti ser transposta pela lâmina fria e pontiaguda do discurso que eu ensaiei para fincar em você. Sou cobaia do meu veneno verbal.

Pois eu que sou duro feito pedra me vejo agora em cacos, eu que não racho fácil virei tábua partida ao meio. E somente assim sinto o peito arfar mais calmo. Porque se a vingança é um prato frio, a certeza é mesmo um perfume, e sinto já o cheiro morno do teu crânio rachado. As minhas palavras vão sair da boca feito uma reza maldita, em sussurro lento e gradual. Feito um aspirador vão sugar teu sangue sujo e preto, até que os músculos sintam sede e ardam e murchem e oscilem e te abandonem. Eu quero você imóvel, dobrada num canto qualquer.

E finalmente vou servir-me do vinho outra vez, comerei um porco em exaltação à tua desgraça. Comerei o mesmo animal que engordarei com os teus restos, o mesmo porco que chegará em molho pardo à minha mesa trazendo em seu fígado o sabor acre das tuas vísceras cretinas. Porque no fim é isso, a tua marca no mundo foi essa cretinice jovial.
Eu vou te transformar em alma penada. Mas irás penar sem as pernas e sem a garganta. Farei leilão em formigueiros com tua língua, teus olhos. Quero que você veja em cores vivas a terra comer teus últimos instantes, quero que você sinta o gosto doce do esterco no teu segundo derradeiro.

Eu vou te mostrar que deus pode pouco com as garras do demônio. Porque só assim eu te salvarei, só assim eu te pouparei do verdadeiro sofrimento. Porque eu te salvo acabando com a tua vida, evitando assim que você mesma o faça.

05 setembro, 2009

Sobre a Copa de 98, romenos e outono


A canção de Cassiano diz, que há um lugar para ser feliz, além de abril em Paris: Outono no Rio.
Porém, é o outono parisiense que tem proporcionado as paisagens e imagens mais belas que vi atá agora na França.
Nesta tarde fui até Saint Denis, distrito de Paris, para assistir a partida válida pelas elimatórioas da copa do mundo de 2010, França x Romênia.
No por do sol mais bonito que já vi em Paris, me emocionei profundamente ao entrar no Stade de France. Em 1998 eu era um menino que acompanhava de perto pela primeira vez uma copa do mundo, e que assistiu apaixonadamente os jogos pela tv.
Palco da abertura e da final, o Stade de France sempre foi um de meus preferidos, e agora entrou para a lista dos estádios que conheço:
1 - Municipal de Juiz de Fora
2 - Municipal de Três Rios
3 - Maracanã
4 - Engenhão
5 - Stade de France
O jogo foi morno, com destaque para Thierry Henry, um mito do futebol, e Anelka, de forma surpreendente o melhor em campo, na minha opinião. Jogou aberto pela ponta direita, vindo buscar o jogo na metade do campo. Henry fazia o mesmo pela esquerda.
E como foi bom torçer para a Romênia. E como foi bom ver o gol de empate da Romênia já na metade do segundo tempo.
E como foi a minha quase vingança.
Quando faltavam 6 minutos, fui embora, havia de pegar o trem para voltar a Paris.
Cheguei em casa com a certeza única de que tenho que levar meu pai neste estádio.